Algumas experiências espirituais de
Sri Ramakrishna
Sri Ramakrishna foi um
extraordinário Mestre de Vedanta que realizou Deus sem forma Nirguna
Brahman, como também realizou Deus com
forma Saguna Brahman, tendo
durante a sua vida inúmeras
experiências divinas dos diferentes
aspectos da Realidade Última (Brahman).Sri Ramakrishna realizou o ideal
espiritual do monismo, do monismo qualificado e do dualismo,
ou seja, Deus sem forma, Deus sem forma com qualidades e Deus com forma.
Com aproximadamente 7 anos Sri
Ramakrishna teve a seu primeiro êxtase espiritual quando caminhava pelas
plantações de arroz próximas da sua casa, comendo arroz inflado que levava
dentro de uma cesta. Olhou admirado para
uma nuvem negra no céu. Momentos depois o céu inteiro estava prenunciando uma
tempestade, quando viu um bando de pássaros brancos como a neve voando, o
contraste do branco e o negro no céu arrebatou o menino fazendo com que ele
experimentasse o seu primeiro êxtase espiritual. Alguns aldeões encontraram-no
desacordado e o levaram para a sua casa
em seus braços. Mais tarde, o menino falou que durante aquele momento
experimentou uma felicidade indescritível.
Aos nove anos de idade Sri Ramakrishna, durante uma
apresentação teatral realizada na noite de Shivaratri, em comemoração à Shiva, substituiu
o artista que deveria representar Shiva que estava enfermo. Ao entrar em cena
apoiado por seus amigos, com o corpo todo coberto de cinzas, com os cabelos
emaranhados, com um colar de rudraksha no pescoço e um tridente nas mãos
parecia a imagem viva de Shiva. As pessoas que estavam assistindo a cena
ficaram emocionadas e o aplaudiram muito, mas logo se deram conta que o menino estava
realmente absorto em meditação. Do seu rosto corriam torrentes de lágrimas. O
efeito desta cena foi tremendo e as pessoas sentiram-se abençoadas com essa
visão, como se tivessem visto o próprio Shiva. A apresentação foi suspensa e o
menino ficou nesse estado até a manhã seguinte.
Aos 20 anos
de idade, já como sacerdote do templo de Kali em Dashineswar. Nessa época
(1856) Sri Ramakrishna iniciou a sua sadhana (práticas espirituais) que durou
aproximadamente quatro anos e estava tão
ansioso para ter a visão direta da Divina Mãe que passava as noites em
meditação e oração sem a ajuda de um mestre e dependendo exclusivamente do seu
intenso anelo pela realização divina. Nos momentos de desespero exclamava: “Ó
Mãe, tu és verdadeira, ou tudo é uma ficção, mera poesia, sem nenhuma verdade?
Se existes de verdade porque não Te vejo? A religião é pura fantasia e Tu és
tão somente uma criação da imaginação humana?
Mas não teve
que esperar muito e descreveu sua primeira visão da Mãe com essas palavras:
“... de repente a Bendita Mãe se revelou. Os edifícios com suas
distintas partes, o templo e tudo o mais desapareceu da minha vista sem deixar
nenhum rastro; em seu lugar percebi um ilimitado, infinito e fulguroso Oceano
de Consciência. De todos os lados, e até aonde alcançava a minha vista, ondas
luminosas precipitavam-se em minha direção como enlouquecidas e, com um ruído
aterrador, pareciam me devorar. Arquejante, esgotado pelo embate, fiquei
inconsciente. Não estava consciente do que se passava no mundo externo; mas em meu interior fluía
uma contínua corrente de pura felicidade, até então desconhecida, e senti a
presença da Divina Mãe.”
A medida que
se aprofundava o seu estado espiritual Sri Ramakrishna se sentia cada vez mais
como filho da Divina Mãe do Universo. Entregou-se por completo à Sua vontade e
deixou que Ela o guiasse.
A sua
constante prece era:
“Ó Mãe,
tomei refúgio em Ti.
Ensina-me
o que devo fazer e o que devo dizer.
Tua
vontade é que sempre prevalece e é para o bem de Teus filhos.
Que Tua
vontade seja a minha vontade.
Faça de
mim o Teu instrumento.”
As visões de Sri Ramakrishna
tornaram-se cada vez mais profundas e íntimas. Já não lhe era necessário
meditar para perceber a Divina Mãe. Mesmo quando mantinha a consciência do
mundo exterior, ele A via tão palpável como os templos, as árvores, o rio e as
pessoas.
Um dia Sri Ramakrishna deu a um gato
a comida que deveria ser oferecida a Kali e Sri Ramakrishna descreveu o
incidente com estas palavras:
“A Divina Mãe me revelou no templo
de Kali que era Ela que se havia convertido em tudo. Mostrou-me que todas as
coisas estavam cheias de Consciência. A imagem era Consciência, as vasilhas de
água eram Consciência, o umbral da porta era Consciência, o piso de mármore era
Consciência, tudo era Consciência. Percebi que tudo no interior do templo
estava como embebido, por assim dizer, de Bem-aventurança, a Bem-aventurança de
Deus. Defronte do templo vi um homem malvado, mas também nele reconheci o poder
vibrante da Divina Mãe. É por isso que dei ao gato a comida que deveria ser
oferecida à Divina Mãe. Percebia com muita clareza que tudo era a Divina Mãe, inclusive o gato ...”
Nessa época a mente de Sri
Ramakrishna foi atraída para Raghuvir, que era a divindade
adorada em seu lar e como Mahavir quis realizar Rama assumindo a atitude de
Hanuman, o perfeito servo do Senhor. Em
pouco tempo foi abençoado com a visão de
Sita, a divina consorte de Rama, que apareceu para ele fisicamente no
Panchavati iluminando todo o lugar e dirigindo-se em sua direção, entrou em seu
corpo, e ao se dissolver nele disse: “Eu
te concedo o meu sorriso.” Nessa época desenvolveu-se na região cóccix
do seu corpo uma saliência de quase uma polegada. Certa vez perguntamos a Sri
Ramakrishna se essa parte do seu corpo continuava assim e ele respondeu: “Não,
com o correr do tempo ela voltou ao seu estado natural quando o domínio daquele
estado sobre minha mente terminou.”
Durante o período da sua sadhana, a
sua mente pura e santa tornou-se o seu Guru e ensinou-lhe tudo o que o que ele deveria
realizar. Muitas vezes a sua mente, por
assim dizer, assumia a forma de uma
outra pessoa que o encorajava ou o ameaçava com castigo se não mergulhasse
profundamente numa determinada disciplina espiritual. Durante a sua meditação o
Mestre viu um Sannyasin com um afiado tridente na mão, sair do seu corpo e
dizer: “Se não abandonar todos
os outros pensamentos e meditar de todo o coração no Ideal Escolhido,vou
atravessar-lhe o coração com este tridente.” Noutra ocasião viu que quando o Papa-purusha, personificação
da natureza inferior ou animal do homem, saiu do seu corpo e um jovem sannyasin
simultaneamente apareceu e matou aquele ser maligno. Esse sannyasin, com forma
idêntica à sua, o instruía sobre tudo o que necessitava para as suas práticas
espirituais.
Um dia Haladhari, sobrinho de Sri
Ramakrishna, disse-lhe que
Deus é incompreensível para a mente humana, deixando o Mestre em dúvida com
respeito as suas visões:
“Soluçando eu rezei à Mãe: ‘Você é capaz de me enganar dessa maneira só
porque eu sou um ignorante? Uma torrente de lágrimas brotou dos meus olhos.
Nesse momento vi elevar-se do chão uma massa nebulosa que preencheu todo o
espaço diante de mim. No centro dessa neblina apareceu um rosto com uma barba
ondulante, sereno, muito expressivo e belo. Fixando firmemente o seu olhar
sobre mim, disse em tom solene: ‘Permaneça em bhavamukha, no umbral da consciência relativa.’ Repetiu
essas palavras três vezes e logo em seguida desapareceu pouco a pouco na neblina, que por sua vez
também se dissolveu. Esta visão me devolveu a confiança de estar certo.”
Aos vinte e
três anos Sri Ramakrishna casou-se com uma menina de cinco anos, chamada de Saradamoni
(mais tarde conhecida como Divina Mãe Sarada Devi) que vivia em
Jairambati. Já com essa idade essa
menina costuma rezar assim: “Ó Deus, mesmo na lua existem manchas escuras; faça com que meu caráter
seja imaculado.” Essa foi a menina escolhida para noiva de Sri
Ramakrishna. Na Índia a realização de um
casamento como esse tem um caráter de compromisso e se consuma somente quando a
consorte atinge a maioridade.
Certa vez
quando estava viajando de palanquim de Kamarpukur ao vilarejo chamado Sihar,
Sri Ramakrishna estava muito feliz ao admirar a exuberante natureza que o
rodeava, quando dois lindos meninos de tenra idade saíram do seu corpo e
passaram a acompanhá-lo correndo e brincando e outras vezes caminhando ao lado
do palanquim. Depois de passar um longo
tempo fora retornaram para dentro do seu corpo. Mais tarde a Brahmani confirmou
que Chaitanya e Nityananda estavam morando dentro dele.
Ao retomar as
suas funções de sacerdote no templo de Kali submeteu-se a novos exercícios de
disciplinas espirituais para erradicar a cobiça e a luxúria, que considerava os
maiores impedimentos para o progresso espiritual. Com uma rúpia em uma mão e um
punhado de terra na outra, refletia sobre os seus valores dessas coisas para
alcançar a Deus e vendo que as mesmas não tinham nenhum valor para esse
propósito, atirou-as no Rio Ganges com igual indiferença. Quanto às mulheres
ele as considerava como manifestações da Divina Mãe. Jamais, nem mesmo em
sonhos, sentiu os impulsos da concupiscência.
Em torno de 1861
chegou a Dadshineswar a futura Guia Espiritual de Sri Ramakrishna chamada de Brahmani,
que teria um papel muito importante na sua ascensão espiritual. Ela o orientou
nas disciplinas tântricas e vaishnavas. Tinha então pouco mais de 50 anos e
usava a roupa ocre de uma monja.
Sri Ramakrishna
descreveu-lhe suas experiências e visões e lhe contou que as pessoas achavam
que ele estava louco. Ela o escutou com atenção e disse-lhe: “Filho meu, neste mundo todos são
loucos. Alguns são loucos por dinheiro, outros por comodidades materiais, outros por renome e fama; e você é
louco por Deus.” Deu-lhe a certeza de que estava passando por
uma experiência espiritual quase desconhecida, que nas escrituras era descrita
como mahabhava (o mais exaltado enlevo de amor
divino). Disse-lhe ainda que as
escrituras sobre bhakti descreviam somente dois exemplos dessa experiência, a
de Radha e de Sri Chaitânia.
Sob a
orientação de Brahmani, Sri Ramakrishna praticou, no Panchavati e sob a árvore
de bel, todas as disciplinas dos 64 livros principais de Tantra, e em nenhum caso
demorou mais de três dias para alcançar o resultado prometido por qualquer um
deles. Realizou que o mundo inteiro e tudo o que há nele não é nada mais do que
lilá, o jogo de Shiva e Shakti. Por todos os lados via
manifestados o poder e a beleza da Divina Mãe; o mundo inteiro, animado e
inanimado, parecia-lhe impregnado de Chit (Consciência) e de Ananda
(Bem-aventurança).
Em uma visão
Sri Ramakrishna viu a Causa Ulterior do universo como um enorme triângulo
luminoso, dando nascimento a cada momento, a um número infinito de mundos.
Ouviu o Anahata Shabda, o grande som Om, do qual os
inumeráveis sons do universo não são apenas muitos ecos. Obteve os oito poderes
sobre-naturais da yoga que torna um homem quase onipotente, mas ele os rejeitou
porque não via neles nenhum valor para o Espírito. Teve a visão da divina Maya, o inescrutável poder de Deus, pelo qual o universo é criado,
sustentado e no qual finalmente é absorvido.
Numa visão viu emergir do Ganges e se aproximar lentamente do Panchavati
uma mulher de uma extraordinária beleza, que estava para se tornar mãe. Em
seguida deu a luz a uma criança e começou a amamentá-la ternamente. Um instante
depois assumiu um aspecto terrível, pegando a criança com suas presas horríveis
esmagou-a e devorando-a entrou novamente nas águas do Ganges.
Mas a
experiência mais notável neste período, foi o despertar da Shakti Kundalini, o
“Poder Serpentino”. Na verdade ele viu o Poder, primeiramente adormecido no
final da sua coluna espinal, e logo se despertando e ascendendo pelo canal
místico do Suchumna, passando pelos seus seis centros, ou lótus, até o
Sahasrara, o lótus de mil pétalas no topo da cabeça. Além disso, viu que, à
medida que a Kundalini subia, os
diferentes lótus floresciam...
Tendo cumprido
a sadhana tântrica (prática tântrica), Sri Ramakrishna, sob a orientação da
Brahmani, iniciou a prática das disciplinas do Vaishnavismo. Os
vaishnavas são adoradores de Vishnu, o “que tudo Permeia”, o Deus
Supremo, que também é conhecido como Hari e Narayana. Das diversas encarnações de Vishnu as duas que
possuem o maior número de seguidores são Rama e Krishna. O Vaishnavismo
pratica exclusivamente Bhakti, que é o intenso amor por
Deus. Para desenvolver o amor do devoto por Deus, o Vaishnavismo humaniza Deus,
que pode ser adorado como Pai, Mãe, Mestre, Amigo, Filho e Amante.
Sri
Ramakrishna, através de uma pequena imagem de metal de Ramlala, realizou Rama.
Essa pequena imagem tornava-se viva e dançava graciosamente para ele e sempre o
acompanhava. Nessa época Sri Ramakrishna tornou-se cheio de amor maternal
e adorou também a Mãe Divina como Sua companheira e serva. Ele realizou também
a completa união com o seu Bem-Amado Krishna, assumindo a postura como
uma das gopis de Vrindavan.
As escrituras
vaishnavas aconselham que se deve propiciar Radha, a divina consorte de
Krishna, para obter a graça de realizar o Bem-Amado. Sri Ramakrishna dirigiu
suas preces à Radha e em pouco tempo ele teve a sua abençoada visão. Ele viu e
sentiu a figura de Radha desaparecendo em seu próprio corpo e mais tarde ele
disse: “É impossível descrever
a beleza celestial e a suavidade de Radha. Sua própria aparência mostrou que
ela tinha se esquecido completamente de si mesma no seu apego apaixonado por
Krishna. A cor da sua pele era amarelo claro.”
Unido agora com Radha, ele
manifestou seu grande amor extático, o mahabhava, que encontra nela a mais
plena expressão. Mais tarde Sri Ramakrishna disse: “A manifestação numa mesma pessoa das dezenove classes
diferentes de emoção por Deus é chamada, nos livros de bhakti, mahabhava. Uma
pessoa comum leva uma vida inteira para expressar apenas uma dessas emoções.
Mas nesse corpo (referindo-se a si mesmo) houve uma completa manifestação de
todas as dezenove.” O amor de Radha é precursor da visão resplandecente
de Sri Krishna e Sri Ramakrishna logo teve essa visão. A forma encantadora de
Sri Krishna apareceu-lhe e fundiu-se em sua pessoa. Tornou-se Krishna,
esquecendo-se completamente da sua própria individualidade e do mundo. Via
Krishna em si mesmo e no universo. Assim ele atingiu a realização total da
adoração do Deus Pessoal. Só o Espírito Impessoal
pode gozar da comunhão com o Deus Impessoal. Por isso a mais alta realização
vaishnava está próxima à experiência transcendental do vedantista.
A Brahmani,
de quem Sri Ramakrishna havia dependido durante três anos, viu seu filho
espiritual escapar-lhe para seguir a orientação de um mestre de força
masculina, de aparência rígida, um físico robusto e uma voz viril. O novo guru,
chamado de Totapuri, o desnudo, era um monge errante que chegou ao jardim
templo de Dakshineswar no final de 1864.
Totapuri era
um mestre realizado de uma filosofia nova para Sri Ramakrishna, a filosofia da Vedanta
não-dualista, que designa a Realidade Última como Brahman, também descrita
como Satchidananda
(Existência-Conhecimento-Bem-Aventurança Absolutos). Segundo a Vedanta
Brahman é a única Existência Real, onde não há tempo, nem espaço, nem
causalidade, nem multiplicidade. Mas devido à Maya, que é o seu poder
inescrutável, tempo, espaço e causalidade são criados e o Uno parece dividir-se
em muitos. O Eterno Espírito aparece como uma multiplicidade de indivíduos com
forma e sujeito às condições de tempo.
Totapuri era
o monge chefe de um monastério que congregava setecentos sannyasins. Durante
quarenta anos praticou austeras disciplinas junto ao rio Narmada realizando
finalmente sua identidade com o Absoluto. A partir dessa experiência ele saiu
em peregrinação e chegou a Dakshineswar no final de 1864. Ao ver Sri
Ramakrishna reconheceu que ele estava preparado para praticar a Vedanta e se
propôs para iniciá-lo em seus mistérios. Com a permissão da Divina Mãe ele
aceitou. Então Totapuri disse a ele que somente um sannyasin podia receber o
ensinamento da Vedanta. Sri Ramakrishna consentiu em renunciar ao mundo mas
pediu que a cerimônia da sua iniciação na Ordem Monástica dos Sannyasins fosse
feita em segredo, para não ferir os sentimentos de sua mãe que vivia com ele em
Dakshineswar.
Na madrugada
do dia fixado foi acesa uma fogueira no Panchavati e Mestre e Discípulo
sentaram-se diante dela, onde foi realizado o ritual em que Sri Ramakrishna fez
os votos de renunciar o seu apego aos familiares, amigos, corpo, mente, órgãos
sensórios, ego e o mundo. Após terem sido cumprido os ritos o Discípulo recebeu
do seu Guru a vestimenta ocre da sua nova vida. Então dirigiram-se a um quarto
de uma casa de meditação próxima onde Totapuri compartilhou com seu discípulo
as grandes verdades da Vedanta e pediu-lhe para que retirasse sua mente de
todos os objetos do mundo relativo, inclusive dos deuses e deusas, e que se
concentrasse no Absoluto.
Referindo-se
a esse episódio Sri Ramakrishna certa vez disse: “Depois da iniciação, Nangtá começou
a ensinar-me as diversas conclusões da Vedanta monista e me pediu para que
retirasse completamente a mente de todos os objetos e mergulha-se fundo no Ser.
Mas, apesar de todas as minhas tentativas não pude cruzar por completo o reino
de nome e forma e levar minha mente ao estado não condicionado. Não tive
nenhuma dificuldade em retirar a mente de todos os objetos do mundo. Mas a
figura radiante e muito familiar da Mãe Bem-aventurada, personificação de tudo
o que significa a Consciência Pura, pareceu-me como uma realidade vivente. O
seu sorriso feiticeiro me impedia de passar ao Grande Além. Tentei uma e outra
vez mas Ela me impedia de passar. Desesperado, disse ao Nangtá: ‘Não há nada a
fazer. Não consigo elevar minha mente ao estado não condicionado e ficar frente
a frente com o Ser.’ Desesperado o Nangtá me disse em tom cortante: ‘O que? Não
consegues fazê-lo? Mas deves fazê-lo.’ Olhou ao seu redor e vendo um pedaço de
vidro, pegou-o e cravou o mesmo entre os meus olhos.” Com a voz trovejante
disse: ‘Concentra a tua mente neste ponto.” Assim, com firme determinação
comecei a meditar novamente. Então, quando a forma agraciada da Divina Mãe
apareceu diante de mim, usei meu discernimento como espada e A parti em
duas. Caiu então a última barreira. Meu
espírito foi além do plano relativo e me perdi em samadhi.”
Sri Ramakrishna permaneceu
totalmente absorto em samadhi por três dias.
“Será que é verdade?” Exclamou Totapuri com assombro. “Será possível que
ele tenha conseguido em um só dia o que eu levei quarenta anos de árduo esforço
para alcançar?” “Meu Deus, não é nada
menos que um milagre!” Com a ajuda de Totapuri a mente de Sri Ramakrishna
finalmente desceu ao plano relativo. Totapuri, monge errante extremamente
ortodoxo, nunca se detinha mais de três dias num mesmo lugar. Mas permaneceu em
Dashineswar onze meses. Sob a orientação de Sri Ramakrishna ele realizou no
final desse período a Divina Mãe e então pediu para Sri Ramakrishna autorização
para continuar com a sua peregrinação.
No fim de
1866 Sri Ramakrishna começou a praticar as disciplinas do islã. Sob a direção
de um mestre muçulmano entregou-se às novas práticas espirituais. Vestindo-se
como um muçulmano, repetia o nome de Alá. Suas orações tomaram a forma das
devoções islâmicas. Esqueceu todos os deuses e deusas hindus – até de Kali – e
deixou de visitar os templos. Após três dias teve a visão de uma figura radiante, talvez de Maomé.
Essa figura se aproximou suavemente e se uniu com ele. Dessa forma alcançou a
realização do Deus dos muçulmanos. A partir daí passou a entrar em comunhão com Brahman. O
poderoso rio do islã também o levou de volta ao Oceano do Absoluto.
Oito anos
mais tarde, em novembro de 1874, Sri Ramakrishna teve um desejo irresistível de
experimentar a verdade da religião cristã. Começou por escutar as leituras da
Bíblia feitas por Shambhú Charan Mallick, um devoto do Mestre. Sri Ramakrishna
ficou fascinado pela vida e ensinamentos de Jesus. Certo dia, estando sentado
na sala da casa que Yadú Mallick possuía em Dashineswar seus olhos se fixaram
num quadro da Virgem Maria e Menino Jesus. Olhando-o com intensa atenção foi
tomado pouco a pouco por uma divina emoção. As figuras do quadro tornaram-se
vivas e os raios de luz que delas emanavam entraram em sua alma. O efeito dessa
experiência foi mais forte do que a visão de Maomé. Exclamou: “Oh, Mãe! O que estás fazendo comigo?”
E rompendo as barreiras de credo e religião entrou em um novo reino de êxtase.
Cristo tomou posse da sua alma. Por três dias não pisou no templo de Kali. Na tarde do
quarto dia, enquanto caminhava no Panchavati, viu se aproximar dele uma pessoa
de grandes e formosos olhos, de tez clara e expressão serena. Ao ficarem frente
a frente, ressoou uma voz no fundo da alma de Sri Ramakrishna dizendo: “Eis aqui Cristo, quem verteu o sangue
do Seu coração para redimir o mundo; quem padeceu um mar de angústia por amor à
humanidade. Mestre de iogues, Ele está em permanente união com Deus. É Jesus,
Amor Encarnado.” O Filho do Homem se abraçou então com o Filho
da Divina Mãe e Se uniu com Ele. Sri Ramakrishna experimentou sua identidade
com Cristo, como já havia experimentado sua identidade com Kali, Rama, Hanuman,
Radha, Krishna, Brahman e Maomé. O Mestre entrou em samadhi e comungou
intimamente com Brahman dotado de atributos. Sri Ramakrishna aceitou também a
divindade de Buda e costumava fazer referência da semelhança dos seus ensinamentos
com os Upanishads.